Em Portugal, é possível aplicar uma primeira dose da vacina AstraZeneca seguida de uma segunda dose da vacina da Pfizer-BioNTech ou da Moderna. Os dados preliminares sobre esta sequência de vacinas contra a Covid-19 indicam que esta é uma abordagem segura e eficaz. No entanto, o regulador europeu aguarda por mais evidências para confirmar a segurança e a eficácia deste esquema vacinal. Outras combinações de vacinas não são, por enquanto, aconselhadas. Esta estratégia de combinar doses de vacinas diferentes (numa primeira e segunda inoculação) no mesmo esquema vacinal é conhecida como esquema heterólogo de vacinação.
É seguro combinar doses de vacinas diferentes contra a Covid-19?
Existem vários tipos de vacinas Covid-19 autorizados em Portugal. Mas será que é possível e seguro combinar doses de vacinas diferentes no mesmo esquema vacinal (vacinação heteróloga sequencial)? Descubra a resposta.
Combinar vacinas da AstraZeneca (1ª dose) com vacinas Pfizer-BioNTech ou Moderna (2ª dose) está previsto na norma 003/2021 da DGS.
No final de maio de 2021, a Direção-Geral de Saúde (DGS) passou a recomendar a pessoas com menos de 60 anos que tiveram uma primeira dose da vacina da AstraZeneca (Vaxzevria) o reforço com uma vacina com tecnologia ARN mensageiro (ARNm ou, na sigla em inglês, mRNA) na segunda dose. Ou seja, um esquema vacinal que combina a primeira dose AstraZeneca com uma segunda dose da vacina Pfizer-BioNTech ou da Moderna.
Portugal não é o único país europeu onde é possível usar vacinas diferentes na imunização completa dos seus cidadãos. Espanha, Alemanha, França e Itália também seguiram a mesma estratégia. A Agência Europeia dos Medicamentos (EMA, na sigla em inglês) aguarda por mais evidências para emitir uma recomendação final sobre este esquema vacinal, ainda que os resultados preliminares dos estudos efetuados indiquem que esta estratégia é segura e eficaz.
O que indicam os estudos preliminares sobre combinar doses de vacinas diferentes no mesmo esquema vacinal contra a Covid-19?
Combinar doses de vacinas diferentes num esquema vacinal para aumentar a resposta imunitária a uma doença infeciosa não é uma novidade: esta abordagem já foi explorada no desenvolvimento de vacinas contra o Ébola ou contra a tuberculose. Também os investigadores que estão a trabalhar no desenvolvimento de uma vacina contra o vírus da imunodeficiência humana (VIH) têm recorrido a esta estratégia. A ideia subjacente a esta abordagem é que vacinas diferentes podem gerar uma maior proteção.
Em certos casos, administrar vacinas diferentes no mesmo esquema vacinal permite estimular elementos diferentes do sistema imunitário. Noutros casos, é possível ensinar o organismo a reconhecer o vírus de formas diferentes.
A Sputnik V (Gam-COVID-Vac), vacina contra a Covid-19 desenvolvida pela Rússia – que aguarda avaliação da EMA para poder ser introduzida de uma forma condicional no mercado europeu – aposta neste princípio através da utilização de dois vetores virais diferentes (adenovírus Ad26 e Ad5) associados à proteína do vírus (SARS-CoV-2) que causa a Covid-19: um é usado na primeira dose e o outro é usado na segunda dose da vacina, precisamente para tentar desencadear uma resposta imunitária mais robusta.
Mas para que esta abordagem possa ser amplamente implementada, não basta ser eficaz na proteção contra a Covid-19. É também crucial que seja segura. Neste campo, dois estudos internacionais analisaram esquemas vacinais com uma dose vacina da AstraZeneca seguida por uma segunda dose da vacina Pfizer-BioNTech, tendo divulgado já os primeiros resultados:
– Estudo CombivacS – Instituto de Saúde Carlos III (Espanha) – os resultados preliminares do estudo, apresentados em maio 2021, indicam que com esta combinação, “a resposta do sistema imunitário é bastante reforçada (…) e os efeitos adversos observados encontram-se dentro do esperado, sendo leves ou moderados e principalmente restritos aos primeiros 2-3 dias após a administração da vacina” (após esquema vacinal completo).
– Estudo Com-COV – Universidade de Oxford (Reino Unido) – apresentou em maio resultados preliminares que indicavam que a aplicação sequencial destas vacinas poderia ser mais propensa ao desenvolvimento de efeitos secundários leves e moderados (em comparação com pessoas que receberam duas doses da mesma vacina). Dados mais recentes, divulgados no final de junho, mostram que a administração de uma dose da vacina AstraZeneca e uma dose da vacina Pfizer-BioNTech (com intervalo de 28 dias) gera uma melhor proteção face ao esquema vacinal de duas doses AstraZeneca, o que pode ser um bom indicador da eficácia desta combinação.
A Universidade de Oxford está também a analisar outras combinações que vão incluir as vacinas da Moderna e da Novavax (neste momento em avaliação pela EMA para poder ser introduzida na União Europeia), entre outras. Outros estudos estão a ser realizados para avaliar diferentes esquemas heterólogos, nomeadamente uma primeira dose da vacina Sputnik (Ad26) com uma segunda dose da vacina da AstraZeneca.
Reguladores aguardam por mais evidências
Enquanto decorrem os ensaios clínicos, a posição dos reguladores é cautelosa. No passado mês de junho, Marco Cavaleri, responsável pela task force de vacinação Covid-19 da EMA, lembrou que neste momento ainda existem poucas evidências sobre o uso de vacinas diferentes no mesmo esquema vacinal contra a Covid-19, mas alguns estudos preliminares mostraram que, de facto, a resposta imunitária parece ser satisfatória e não surgiram questões do ponto de vista da segurança. Apesar de otimista, o especialista mostrou-se cuidadoso: “parece que esta é uma estratégia que pode ser implementada, mas existem poucas evidências e é muito importante que recolhamos mais informação”.
Também a Organização Mundial de Saúde (OMS) reforça, no site oficial, que “até ao momento não temos informação suficiente para poder recomendar este tipo de esquemas vacinais”